Notícias

Bahia Notícias: 'A Bahia é um estado machista', diz presidente da comissão de proteção da mulher da OAB-BA

por Cláudia Cardozo/ Bahia Notícias

A coluna Justiça do Bahia Notícias, neste mês de março, enfoca as diversas faces femininas do Judiciário baiano, em uma série de entrevistas que serão publicadas ao longo deste mês. A presidente da Comissão de Proteção da Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB-BA), Andrea Marques, é a primeira entrevistada da coluna nesta série especial. Andrea Marques, que também é conselheira da Ordem baiana, fala sobre os trabalhos da comissão, do empoderamento da mulher na sociedade, e da necessidade de cada vez mais as mulheres ocuparem espaços de poder. Segundo a presidente da comissão, as mulheres enfrentam muitas dificuldades para se estabelecer como advogadas em um 'estado machista" como a Bahia, apesar do alto número de advogadas no estado. "A Bahia é um estado machista, apesar de a capital ser sempre um local mais avançado do que no interior, mas a gente sabe que de todas as capitais do Brasil, Salvador não é um exemplo de modernidade. Apesar disso, as mulheres são a maioria nas faculdades de direito, e elas já são a metade dos quadros da Ordem. Nós já pagamos metade da conta, e nós realmente queremos sentar à mesa e usufruir do banquete, mas infelizmente, não ocupamos os cargos de poder da OAB ainda". Leia a entrevista completa na coluna Justiça.

Bahia Notícias - A senhora preside a Comissão de Proteção da Mulher da OAB-BA. Como é o trabalho da A senhora preside a Comissão de Proteção da Mulher da OAB-BA. Como é o trabalho da comissão aqui na Bahia?

Andrea Marques - A Comissão de Direitos de Proteção da Mulher da OAB-BA existe há algum tempo. A proposta é que ela seja uma comissão permanente da Ordem. Eu sou presidente da comissão e conselheira da Seccional da Bahia e isso facilita bastante a interação entre a OAB e a Comissão. Existem projetos da comissão que foram apresentados ao Conselho Federal da OAB. Um deles é o projeto de lei da licença maternidade para a mulher advogada: este projeto é interessantíssimo, ainda mais agora, com a reforma do Código do Processo Civil. A nossa ideia é a de implementar as mudanças dentro do próprio estatuto da OAB, com uma alteração no artigo 7º. Seria o acréscimo de uma prerrogativa para as advogadas que se tornarem gestantes no curso de um processo em que atuem sozinhas na procuração. Como a  relação com o cliente é uma relação de confiança, obviamente, não pode ser obrigatório o substabelecimento para outro profissional. É exatamente neste momento em que ela se vê diante da necessidade de parar para a maternidade. A gente gostaria que houvesse uma sensibilidade da sociedade quanto ao tema. Afinal, a proteção que se busca aí é a do menor, da criança, do novo cidadão. Não é um privilégio para a mulher advogada, não se trata disso. A Comissão quer mudar o foco. Queremos trazer o foco para o bebê, para a criança, que, nos primeiros meses de vida, precisa da companhia da sua mãe.Fizemos o esboço do projeto de lei e levamos para o Conselho Pleno no final de 2013. Esse esboço de projeto de lei criou uma grande discussão dentro da reunião do Conselho Pleno, realizado em Feira de Santana. Para nossa felicidade, houve uma pequena alteração da redação para uma ampliação do alcance desse projeto. A nova redação abarca também advogados que militem sozinhos nos processos e que venham a adotar bebês ou crianças, de acordo com o que a legislação já faz em relação a esse assunto.  O projeto permite que um advogado também tenha esse direito, já que temos a  igualdade de direitos conferida pelo artigo 5º da Constituição Federal de 1988. Em novembro de 2013, aqui em Salvador, quando houve a reunião do Conselho Federal, entregamos esse projeto de lei ao presidente da OAB Nacional, Marcus Vinicius em conjunto com o Conselho Federal pela Bahia, André Godinho. Depois disso, o projeto ganhou o trâmite interno próprio e chegou às mãos da Conselheira Federal pelo Alagoas e também Presidente da Comissão de Proteção aos Direitos da Mulher Advogada, Fernanda Marinela. Ainda não houve deliberação pelo CFOAB.
 
BN - Quais são os desafios que a mulher advogada encontra no exercício da profissão na Bahia?

AM -
Se nós pudermos fazer uma analogia em relação às profissões masculinas, a gente vai verificar uma resistência muito grande na inserção no mercado de trabalho da mulher. A mulher teve muitas dificuldades de se estabelecer, primeiro como uma trabalhadora, depois como uma trabalhadora independente. Até pouco tempo, a mulher para trabalhar precisava da autorização do marido. Ela era obrigada a conquistar um status de senhora, para não ser mal vista.  Então, muitas mulheres se casavam para não ficar ‘mal falada’, para não 'ficar para titia' ou para não se tornar uma 'mãe solteira'.  Veja que o termo "mãe solteira" já é um termo carregado de preconceitos. Mãe é mãe, não importa se solteira ou casada. Então, essa mulher, muitas vezes, primeiro teria que conquistar esse status de casada, pois a mulher que não se casasse sofria pressão social e familiar. O que levava, muitas vezes, a enfrentar problemas psicológicos e de toda a sorte perante o seu próprio meio. Hoje, felizmente,  temos uma tendência a isso se acabar. A mulher tem conquistado seus espaços, mas ainda com muita dificuldade, afinal, estamos em um mundo preestabelecido, as regras já foram ditadas pelo mundo masculino há muito tempo. Para a mulher se inserir nesse mercado de trabalho, em áreas como engenharia, advocacia ou no mundo do esporte, é ainda difícil. Até mesmo dentro da própria OAB,  há um numero reduzido de mulheres, porque às mulheres sempre são 'reservadas no imaginário social' as funções de cuidado, de zelo, de educadora, como enfermeira, professora, secretária, assistente social etc., profissões chamadas de 'típicas das mulheres'.  E a Bahia, não podemos negar, é um estado machista. Apesar de a capital ser sempre  um local mais avançado do que o interior, sabemos que Salvador não é um exemplo de modernidade. As pessoas são extremamente tradicionais e a profissão, por si só, já leva um cunho de tradição, tipicamente masculina. Apesar dessa realidade,  as mulheres são a maioria nas faculdades de Direito, e elas já são quase a metade nos quadros da Ordem quanto ao pagamento das anuidades. Ou seja, parafraseando a querida Fernanda Marinela, nós já pagamos a metade da conta, realmente queremos sentar à mesa e usufruir da refeição, mas infelizmente, não ocupamos quantidade equivalente quanto aos cargos de poder da OAB ainda.
 
BN - E porque ainda não ocupam?

AM - É tudo muito complexo. Quando você imagina a educação que a mulher tem desde a sua infância até sua vida adulta, ela não é estimulada a ser uma líder, a ser poderosa, a enfrentar as coisas. Eu digo sempre que o sexismo, a diferença entre essas imposições de papeis – o que já considero uma violência também – vêm desde a infância, com a diferenciação de cores, dos tipos de brinquedos, símbolos do que será utilizado em sua vida adulta. Obviamente, a mulher consome carros, gosta de andar de avião, vai comprar apartamento, tem uma grande tendência a querer construir, criar. No entanto, a gente sabe que os brinquedos infantis como carros, construções, grandes empresas e até jogos de dinheiro, são sempre voltados para o público do gênero masculino. Paralelo a isso, há toda uma cultura para que essa mulher seja voltada para a família, para a maternidade, para brinquedos caseiros. A mulher é então é educada para ficar dentro de casa, em um ambiente seguro e protegido. Perceba, os meninos podem ir à rua brincar: quando eles ganham uma bola, normalmente conquistam esse direito. O espaço de liberdade é dele e o espaço de enclausuramento é dela. Crescer neste universo cultural é algo que ninguém aqui escapou. Há uma preocupação na Europa em se desmistificar essa coisa de gênero, que casamento é somente entre homem e mulher, com abertura para casamentos homossexuais, com famílias diferentes. Alguns países da Europa estão um pouco mais à frente do que o Brasil, e, obviamente, do que a  Bahia, ou Salvador.

BN - A senhora falou da licença maternidade para mulher advogada, de um projeto de lei para garantir esse direito a elas. Como é a situação delas atualmente? Os prazos são suspensos?

AM - É um transtorno. A gente gostaria de trazer para o Tribunal de Justiça da Bahia um espaço para a criança. Esse é um projeto para esse ano ainda. A mulher advogada precisa do apoio do Poder Judiciário também para auxiliá-la na sua maternidade e isso não é nada demais não. O TRT da 5a Região já está à frente nisso. Eu recebi uma denúncia  a  respeito de uma advogada gestante, que esperou por três horas o início de uma audiência. Mesmo com o pedido de adiamento em razão de seu estado de gravidez, não houve deferimento. São situações como essas que a gente não pode aceitar. É preciso que haja uma sensibilidade de todos os poderes. A mulher, apesar de tudo o que já conquistou, tem uma situação diferenciada em alguns momentos da sua vida, seja na gestação ou quando está amamentando, o que a torna, sim,diferente. Mais especial. Agora convido você a uma reflexão: se a profissão era só de homens, eles iriam pensar em criar espaços para a mulher? Não. O Congresso Nacional iria aprovar projetos de lei para benefício da mulher? Não. A OAB se formada só por homens, quando venha a fazer seus congressos, vai colocar temas de interesse maior de gênero? Não. Logo, é preciso, sim, que essa mulher se despreenda de toda essa educação machista, se liberte, mesmo que pague um preço por isso. Essa é uma maneira de ser independente, de mostrar que pode se firmar no mercado de trabalho e que pode assumir esses espaços de poder. Mas perceba como é complexo. Ela precisa se desvencilhar de conceitos e verdades que foram interiorizados nela para poder se candidatar, por exemplo, ou a abrir uma chapa de concorrência. Até na política, isso acontece, com cargos como de vereadora, deputada, senadora, prefeita, governadora, presidente. É muito difícil para essa mulher que foi educada para ser a frágil, ser a protegida, determinar-se como ser humano capaz de assumir esses espaços de poder. Há uma ideia de que a mulher deve abdicar da sua vida profissional para cuidar dos filhos. Nos primeiros anos de vida de uma criança é extremamente importante a presença de um cuidador, um educador. No entanto, a gente sabe que com o tempo o ser humano vai ganhando autonomia e esse papel da mulher, de mãe, meio que se dissolve no meio do caminho. Atualmente, o homem passou a ser um grande companheiro da mulher, deixou o papel de ser apenas o provedor  - aquele que só ia para o mercado de trabalho ganhar dinheiro e deixava os cuidados com a educação dos filhos para trás.Hoje avançamos. Temos a guarda compartilhada, por exemplo. Eu queria dar um destaque para as mulheres negras da Bahia porque depois da abolição da escravatura, foram as mulheres negras as primeiras a conquistar o mercado de trabalho na cidade. As mulheres brancas não podiam trabalhar sem a autorização do marido, era proibido trabalhar. Trabalhar era um demérito para a mulher branca, era 'mal vista'. A mulher negra é que foi ser a quituteira, a vendedora de roupa,  a vender objetos na praça. Essa mulher negra, que era recém liberta, que também comprava alforria de seus parentes, ela também tinha a sua prole, e normalmente, eram mães solteiras. Desde sempre, a mulher negra na Bahia é motivo de orgulho para nós – mulheres da Bahia. Nós, baianas, que somos as mais africanas de todas do país. Às mulheres negras devemos as nossas primeiras grandes conquistas de gênero no mercado de trabalho urbano.
 
BN - A comissão acompanha os casos de violência contra mulher na Bahia? A comissão preparou alguma programação especial para este mês de março para comemorar o Dia Internacional da Mulher?

AM - A comissão não se diferencia da OAB. É como se fossem fios capilares da Ordem. Justamente por isso, nosso papel é semelhante ao da Ordem. O que a comissão faz é receber denúncias e encaminhar as questões ou para o Ministério Público ou para Defensoria Pública, orientando a sociedade em relação a isso. A comissão se reúne uma vez por mês para discutir projetos. No final do ano passado, fizemos um projeto já para o mês de março. Trabalhamos com estratégia para deixar a sociedade empoderada de conhecimento. O papel preponderante da comissão é levar à sociedade, aos advogados, as autoridades, o que mais inquieta a mulher em Salvador, e na Bahia. O ano passado nós fizemos um seminário muito interessante, chamado ‘Liberdade da mulher: pleno direito ao corpo?’ e esse seminário buscou discutir com diversos profissionais para se identificar em que momento a mulher é dona de seu próprio corpo; quando ela tem direito à sua sexualidade; quando tem direito à maternidade; quando ela não quer exercer a maternidade. Questões como aborto foram tratadas, o corpo da mulher na mídia, o simbolismo do corpo da mulher brasileira dentro e fora do Brasil. E agora, nós realizaremos o seminário ‘Quem mandou nascer mulher?’, no dia 6 de março, às 18h, na Escola Superior de Advocacia (ESA).  Esse título tem a ver com um livro publicado pela Unicef em 1997 e com o fato de que tudo que acontece de mal à mulher, é atribuída culpa à própria mulher. Se ela é estuprada, é porque estava vestindo uma roupa inadequada, se ela foi assediada é porque deu espaço ou porque expôs partes do corpo e fez com que o outro tivesse desejo sexual por ela. Na verdade, todo mundo sabe que isso é um absurdo.  Nós convidamos quatro profissionais para palestrar. Na palestra de abertura, teremos a presença de Dimitri Salles, da OAB-SP, doutor em direito constitucional e membro da comissão de Direitos Humanos da OAB. Haverá três painéis diferentes: de saúde, de trabalho e de violência.  Teremos o sociólogo e advogado Carlos Freitas para falar sobre o mercado de trabalho da mulher. O outro painel, de saúde, será conduzido pela médica sanitarista Greice Menezes, doutora pela Ufba, para falar tanto da violência obstétrica, como as questões do aborto. O aborto em Salvador é a primeira causa de mortandade materna e Salvador é a primeira capital de estupro do país. O conselheiro da OAB e advogado criminalista, Domingos Arjones, quem vai encabeçar a palestra sobre violência, com enfoque na mulher negra. Nosso seminário vai instigar esse público, homens e mulheres que devem lotar a casa. Esperamos que seja um sucesso!

BN - Haverá alguma programação ligada ao esporte também para estimular que as mulheres cuidem de sua saúde e de seu bem estar?

AM - Eu sou aluna do Krav Magá há seis anos. Parei por um tempo porque minha vida é muito corrida e o Krav Magá é muito sério. Precisa de dedicação. Há uma preocupação do mestre Kobi, que trouxe o Krav Magá para o Brasil, de fazer com que nós, cidadãos, tenhamos o direito de nos defender da violência urbana. A preocupação do Krav Magá é com a violência urbana. Sabemos que não se tem um policial militar na hora que a gente quer, do nosso lado. O país está extremamente violento. Então, a gente não pode esperar que o Estado nos proteja, quando a gente sabe que isso não vai acontecer. Os casos de violência são diários. Salvador é campeã de estupro, e por isso, não podemos fechar os olhos. Ou a mulher aprende a se defender e a sobreviver em situações como essas – ou a realidade de Salvador vai continuar a mesma. A mulher pode, sim, se proteger disso. Ela não vai se masculinizar com o Krav Magá. O Krav Magá vai dar a ela inteligência, vai dar perspicácia, para que ela perceba como é possível sobreviver em situações de extremo perigo. Ela só vai ganhar mais autoconfiança, porque uma das coisas mais importantes que o  Krav Magá ensina é 'recuar atacando'. Se você recuar demais, o seu algoz ganha mais espaço, mais poder, e você pode ser destruída. As aulas são interessantes para auto-estima da mulher, para seu empoderamento, sua autonomia. Não é um esporte, não é uma luta marcial. É uma técnica de defesa e ataque. O Krav Magá está fazendo uma campanha de defesa para mulheres em todo o país. Todas as academias estão convidando as mulheres, acima de 14 anos, para se inscreverem gratuitamente pelo site na academia mais próxima da sua casa para a aula do dia 07/03, sábado. Basta ligar para fazer a inscrição. O seminário começará às 8h30 e terminará às 12h30, e só pode ser feito por mulheres.  Você não precisa ser aluno de Krav Magá, pode ser qualquer cidadã, magrinha, gordinha, baixinha, não importa. A mulher vai aprender técnicas importantes para sua vida. E se possível, virar aluna.

BN - Também vai acontecer um passeio de bicicleta, não é?

AM - O pedal vai ser no Parque de Pituaçu. Esse é o segundo passeio ciclístico que a comissão faz em parceira com a Caixa de Assistência do Advogado (Caab). Fizemos 50 camisas para os primeiros que chegarem. É um evento importante, porque, 08 de março, é o Dia Internacional da Mulher. Está todo mundo convidado, mãe, pai, filho, advogados, sociedade civil como um todo, grupos de pedal. Eu espero que os advogados e as advogadas compareçam que levem suas bicicletas ou que aluguem uma bike no local. E quem não pode pedalar, que faça parte do grupo da caminhada. Vai ser um dia muito alegre, divertido. Nós também queremos estimular a prática do esporte pela mulher, porque o esporte sempre foi sinônimo de futebol e a gente quer parar com isso. Futebol pode até ser interessante, e é muito, mas a gente tem outros esportes e precisamos trazer essa mulher advogada para o esporte, seja bike, caminhada, vôlei, natação, o que for, mas essa mulher advogada tem que vir pra Ordem com esse intuito, de cuidar da saúde, de seu bem estar. É a mulher advogada que a gente quer, empoderada, que participe, que esteja dentro da OAB. É isso que a gente quer.

BN - Esse ano é ano de eleição para OAB. Será possível visualizar mais mulheres integrando as chapas que concorrerão?

AM - Tem toda essa complexidade que a gente falou. Nós já somos quase metade da Ordem. A mulher integra metade da OAB. Se a gente pegar o quadro de advogados que pagam a anuidade, a gente já paga metade da conta, e não faz sentido a gente pagar a conta e não se sentar à mesa.  A gente quer administrar também, a gente quer gerir, a gente quer trabalhar para que isso seja positivo também para gente, para que os temas levados ao Conselho Pleno, para que as propostas sejam voltadas para o gênero, porque existem demandas diferentes. Foi feito um projeto de cotas, que apesar de não ser o ideal, não ser aquilo que gostaríamos que fosse, foi uma forma de ingressar em maior número dentro desse quadro, dessa instituição historicamente masculina. O projeto é um pouco semelhante à lei de cotas de gênero dos partidos políticos. Mas como pode uma estrutura que sempre foi masculina se tornar uma estrutura feminina? Chega a ser ingenuidade achar que a realidade social mudará com o estalar de dedos. A sociedade conquistou a democracia na Constituição Federal de 1988, mas o Poder Judiciário ainda era o da ditadura, a Polícia Militar ainda era da ditadura. O que mudou foi a Constituição, mas a sociedade leva um tempo maior para se modificar. A questão política é uma questão importante, porque a gente só discute aquilo que a gente tem interesse. É preciso que as mulheres estejam lá dentro para que as discussões sejam travadas, não adianta que eles falem por nós. Quem tem que falar por nossas demandas, somos nós mesmas, colocar em pauta, em voga, mas todo mundo precisa discutir, todo mundo precisa se envolver nisso. A conquista das cotas é transitória. Esperamos que, com o passar do tempo, não se precise mais das cotas, porque naturalmente as chapas de concorrência das seccionais serão formadas por mais mulheres interessadas nesses espaços de poder. E no futuro, talvez, nós tenhamos uma presidente no Conselho Federal da Ordem. As diretorias regionais também serão formadas por mais mulheres. Os conselhos plenos serão formados por mais mulheres, e, quem sabe, em pouco tempo, tenhamos um cenário mais parecido com o das anuidades – metade-metade. O nosso presidente,Luiz Viana, teve esse cuidado, o de trazer para o conselho mais mulheres, mas o número ainda é muito reduzido. Nós podemos contar em menos de duas mãos o número de mulheres formando o conselho da OAB. Não duvido que existam mulheres interessadas em participar. Mas na hora de formar a chapa, eles não pensam muito na figura da mulher. Eles pensam mais nos advogados, que são mais próximos, fazem parte do dia-a-dia deles, são seus colegas sociais. É natural. Mas não podemos deixar que esses espaços de poder sempre sejam tomados pelo gênero masculino quando a gente tem demandas a tratar. Luiz Viana garantiu que se ele vier a ser candidato no próximo triênio, certamente haverá mais mulheres formando a chapa da Ordem. A nossa diretoria tem uma mulher, Ilana Kátia Vieira Campos, isso já é um avanço, mas é claro que a gente precisa avançar mais. Ganha a OAB, ganha todo mundo. Para participar da comissão não basta ser mulher, tem que entender de gênero, envolver-se verdadeiramente com o tema. Precisamos ganhar pessoas para falar sobre gênero com mais conhecimento de causa. Mas a comissão está aberta para receber colaboração de todos. Para realmente integrar a comissão, a gente pede que esta mulher esteja engajada, trabalhando com isso, envolvida de forma mais específica, seja no campo jurídico, histórico, antropológico ou sociológico, para nos trazer elementos profundos e densos.  A gente está tendo uma mudança de postura desde 2013. Essa foi minha proposta, que a comissão da mulher não fosse ‘cor de rosa’, que fosse densa, que tivesse conteúdo, que pudesse nos trazer elementos de força para que possamos ser um elemento de contribuição para a classe dos advogados da Bahia e do Brasil. Desta forma, contribuímos mais com a sociedade e com a OAB. Ganhamos todos. Fonte: Bahia Notícias