Notícias

Como a chacina de Orlando (EUA) nos afeta?

Fomos surpreendidos na manhã do dia 12/6/2016 com a chacina da boate Pulse, espaço voltado para a comunidade LGBT em Orlando (EUA). Na ocasião, um rapaz de 29 anos atirou contra a multidão que ali se divertia, causando a morte de ao menos 50 pessoas, deixando outras dezenas de pessoas feridas. Foi, segundo os registros do noticiário, o maior ataque ocorrido nos EUA desde 11/9/2001. E, orquestrado ou não pelo Estado Islâmico, foi um ataque contra a população LGBT.

Até que ponto isso nos afeta em solo tupiniquim, mais especificamente na Bahia? Bom, nosso estado é famoso por liderar alguns dos rankings nacionais ou regionais, nem sempre tão positivos, a exemplo do número de vitimas de crimes causados em virtude da orientação sexual ou identidade de gênero – conhecidos como crimes de homofobia, em que pese ainda não dispormos de legislação federal que verse sobre o tema.

A partir de coleta de dados realizada pelo GGB (Grupo Gay da Bahia) em âmbito nacional foram registradas aproximadamente 321 mortes por ano nos últimos 3 anos. Ou seja, a cada 28h uma pessoa LGBT é morta no Brasil em virtude de sua orientação sexual ou identidade de gênero. Em 2013, o Estado da Bahia ficou em segundo lugar no número de mortes contra pessoas LGBT no Nordeste, com o registro de 20 mortes, ficando atrás de Pernambuco, com 34, e em 3º lugar no ranking nacional, empatado com o RJ. Em 2014, subimos para a primeira posição no ranking regional, posição que foi mantida em 2015, com 25 mortes e mantivemos a 3ª posição no nacional, tendo em 2015, com 33 mortes, ficado atrás apenas do Estado de São Paulo, responsável pelo maior número de mortes de pessoas LGBT no Brasil, com um total de 55 mortes no ano passado. Os números mostram o gradativo aumento anual do número de mortes e, segundo dados do Disque 100 (do ano de 2012), em média 27,34 casos de violência contra pessoas LGBT são registrados por dia, mas estima-se que a realidade seja bastante superior aos registros.

Em pesquisa feita pela Universidade Federal de São Carlos-SP, 32% dos homossexuais entrevistados afirmaram serem vítimas de discriminação, na forma de agressões físicas ou verbais, dentro das salas de aula. Os professores não sabem reagir apropriadamente diante de tais agressões no ambiente escolar e/ou acadêmico. Os dados convergem com os apresentados pelo Ministério da Educação referente ao ano letivo de 2013, quando foram ouvidos 8.283 estudantes na faixa etária de 15 a 29 anos, em todo o país, constatando-se que 20% desses estudantes não quer ter como colega de classe uma pessoa homossexual ou transexual.

Sendo a OAB uma instituição responsável pela defesa da Constituição, da ordem jurídica do Estado democrático de direito, dos direitos humanos e da justiça social,  é que reafirmamos que se faz necessário continuar discutindo a temática da diversidade sexual e enfrentamento a todas as formas de discriminação contra a população LGBT. É preciso, portanto, discutir os planos estaduais e municipais de educação para que contemplem o ensino do respeito à diversidade de gênero e diversidade nas escolas, já que é através da conscientização e da educação das crianças que teremos a chance de transmutar o preconceito e a discriminação em respeito e convívio pacífico com a diferença e a alteridade. A educação para a diversidade não é uma doutrinação que objetiva converter pessoas ao exercício de práticas sexuais com as quais não se identificam. Seu objetivo é criar as condições, dentro das escolas, para que professores e alunos possam aprender e ensinar o convívio com as diferenças que naturalmente existem na sociedade. É por isso que é necessário falar em respeito à diversidade sexual e de gênero dentro da OAB, regulamentando o uso do nome social pelos advogados e advogadas trans, conforme recentemente aprovado pelo Conselho Federal, bem como respeitando a diversidade sexual e de gênero em todos os espaços institucionais, no Poder Judiciário e nos escritórios de advocacia. É por isso que ainda é importante e relevante falar e discutir a violência que é diariamente praticada contra as pessoas trans. É por isso que ainda precisamos discutir sobre a importância das pessoas poderem utilizar o banheiro que se destina ao gênero com relação ao qual a pessoa se autodetermina, independente de seu sexo biológico. Devemos discutir, debater, dialogar, buscando a conscientização para que não sejamos surpreendidos com massacres como o de Orlando.

Filipe de Campos Garbelotto,
Presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Enfrentamento à Homofobia da OAB-BA.