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[Com participação da OAB-BA, CIDH condena Brasil por explosão que deixou 64 mortos na Bahia]

Com participação da OAB-BA, CIDH condena Brasil por explosão que deixou 64 mortos na Bahia

O caso aconteceu em 1998 em uma fábrica de fogos no município de Santo Antônio de Jesus

Em uma decisão histórica, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) condenou o Estado Brasileiro pelas mortes e violações de direitos humanos de 64 pessoas vítimas de uma explosão em uma fábrica clandestina de fogos de artifício, na cidade de Santo Antônio de Jesus, na Bahia, em dezembro de 1998. A informação foi confirmada ontem (26), pela ONG Justiça Global.

A OAB-BA, através da Comissão de Direitos Humanos, foi uma das entidades a juntar força com a ONG Justiça Global na petição enviada à Corte Interamericana, em 2001, que resultou na condenação dos responsáveis. Além da Seccional, também assinaram o documento o Fórum de Direitos Humanos de Santo Antônio de Jesus, Ailton José dos Santos, Yulo Pereira e Nelson Pellegrino. 

Dos 64 trabalhadores mortos na explosão, 63 eram mulheres. A única vítima do sexo masculino era um menino de 11 anos. Haviam ainda 22 crianças e adolescentes, com idades entre 11 e 17 anos. A maioria era negra. No momento da explosão, havia 1,5 tonelada de pólvora no local.

Em nota enviada pela ONG Justiça Global ao portal de notícias G1, a entidade afirma que "as vítimas se encontravam em situação de pobreza estrutural (...) e não dispunham de nenhuma alternativa econômica senão aceitar um trabalho perigoso em condições de exploração".

Atual vice-presidente da Comissão de Direitos Sociais da OAB-BA e presidente da Comissão de Direitos Humanos do IAB-BA, em 2001, a advogada Cristiane Gurgel presidia a Comissão de Direitos Humanos da OAB-BA e foi pessoalmente a Santo Antônio de Jesus encontrar com as famílias das vítimas.

Mesmo após 19 anos, é impossível não se emocionar ao relembrar as histórias que presenciou naquele cenário de total abandono por parte do poder público. "Foi marcante conversar com uma mãe que perdeu três filhos na explosão. Ninguém ali tinha direito trabalhista garantido ou qualquer tipo de proteção para o trabalho", conta.

Cristiane diz ainda que a pobreza obrigava aquelas pessoas a trabalharem naquelas condições de total desumanidade. "Eles não tinham outra opção de vida e terminaram morrendo de forma bárbara. Foi impactante estar com mães e pais que perderam seus filhos e tantas pessoas que não conheciam seus direitos".

Esperança nos direitos humanos 
Apesar de ainda lembrar com muita tristeza de tudo o que viu, a advogada comemora bastante a decisão da Corte Interamericana. A sentença, segundo ela, é um grito de esperança em meio a esse cenário de negação do direitos humanos em que vivemos em nosso país. Apesar da longa espera, a justiça foi feita e o Brasil se vê obrigado a tomar as medidas de fiscalização e dar assistência às famílias que perderam seus entes.

"É importante dar visibilidade a esse caso em virtude da luta em defesa dos direitos humanos. Para que vejam que essa é uma preocupação mundial. O Brasil assinou a Convenção Americana de Direitos Humanos e tem que responder por isso. Nosso país responde sim internacionalmente frente aos atos que violem as convenções internacionais que assina", afirmou.

Constrangimento internacional
Para o atual presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-BA, Jerônimo Mesquita, a condenação por um organismo internacional demonstra a total inercia e incompetência do Brasil em fazer a reparação desse crime bárbaro. Uma vez que mesmo após tanto tempo não houve qualquer tipo de indenização às famílias e punição aos culpados. 

Jerônimo chama atenção ainda para o corte social e de gênero que se percebe nesse caso, pois a maioria absoluta das vítimas era mulher e todos aqueles que morreram na explosão eram pobres. "A responsabilização é tanto reparar quem foi vítima quanto condenar quem causou o dano, o que não foi feito pelo Estado brasileiro".

Além disso, ele ressalta que essa ineficiência da justiça brasileira a ponto do caso precisar ser decidido por uma corte internacional é constrangedor para a imagem do país. "A lentidão no judiciário causa esse tipo de dano. Passados tantos anos, não há decisões definitivas e as famílias não não receberam nada. É um constrangimento internacional".