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[Nosso tempo é agora: paridade de gênero e equidade racial já!]

Nosso tempo é agora: paridade de gênero e equidade racial já!

“Vivemos o tempo presente, nosso tempo e? hoje, já, agora!
Só pode falar ‘em meu tempo’ alguém que já não mais faça parte deste tempo, que já atravessou a porteira do tempo.
Quem esta? vivo e? deste tempo: de agora!
E quem critica e? porque conhece, mas não ensina”

(Maria Stella de Azevedo Santos, “Meu tempo é agora”, 2010)


A Bahia representa, na narrativa da história das lutas e revoltas populares do Brasil, um território ancestral de força e lideranças, cenário de inúmeros movimentos emancipatórios que, da colonização portuguesa aos dias de hoje, enfrentam bravamente as opressões que nos atravessam. Por isso, lembrar de onde viemos e tão importante quanto compreendermos para onde vamos ou queremos ir, honrando as trajetórias de luta que nos servem de exemplo. A origem do Instituto dos Advogados, ainda nos tempos imperiais e, anos mais tarde, a criação da própria Ordem dos Advogados do Brasil, em 1930, remetem-nos a uma composição institucional elitista e excludente, assentada no paradoxo de um Conselho Federal que defendia a justiça da porta para fora, mas, da porta para dentro, legitimava obstáculos para a participação popular e igualitária.

O Ordem dos Advogados do Brasil celebrou ontem um dia histórico: a aprovação, por aclamação, da proposta de paridade de gênero e, por maioria, da proposta de cotas raciais de 30%. Reconheceu-se, ainda, a aplicabilidade imediata das alterações para as eleições de 2021: um importantíssimo passo rumo a um sistema de eleições institucional mais democrático e plural e, especialmente, mais apto a refletir a justiça que professamos defender. Que essa data não seja lembrada apenas como uma conquista para as mulheres ou para as pessoas negras, mas para toda a classe, ou mesmo para toda a sociedade. Quanto mais vozes se fizerem falar e ouvir nos importantes debates políticos protagonizados pela OAB, mais fiéis e coerentes seremos ao compromisso democrático que assumimos. Reduzir a paridade de gênero e a equidade racial a vitórias restritivamente identitárias é apequenar-se na narrativa daqueles que se empenham em perpetuar as estruturas patriarcais, coloniais e racistas de um passado não tão distante e que ainda se fazem sentir.

Mesmo sabendo que tais alterações são fruto de um movimento coletivo e muito mais amplo do que seríamos capazes de descrever nessas breves linhas, não podemos deixar de enaltecer a liderança baiana em todo o processo político de reforma eleitoral. Daniela Borges, presidenta da Comissão Nacional da Mulher Advogada; Silvia Cerqueira, presidenta da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade e Luiz Viana Queiroz, vice-presidente do Conselho Federal da OAB e presidente da Comissão Especial de Avaliação das Eleições do Sistema OAB, foram os baianos que estiveram na condução da mais importante mudança eleitoral na história da Ordem dos Advogados do Brasil desde a sua fundação. Merece destaque, também, a conselheira estadual Maíra Vida, presidenta da Comissão Especial de Combate à Intolerância Religiosa da OAB-BA, uma das representantes do Movimento de Juristas Negras e Negros do Brasil ouvida na sessão em que o CFOAB votou as propostas.

Já nas eleições para o triênio 2019-2021, muito antes da aprovação das alterações em âmbito nacional, a Bahia já elegia a sua primeira chapa paritária em termos de gênero, servindo de exemplo para todo o país. Essa composição plural foi decisiva para lançarmos, em 2020, as atividades da “Agenda OAB: democracia, antirracismo e justiça”, afirmando o nosso compromisso em buscar mais equidade racial para o sistema OAB. O dia de ontem mostrou que os sonhos em que acreditamos são possíveis, e que sabemos por qual futuro lutamos. Muito nos honra saber que a Bahia foi tão bem representada e, mais ainda, fez valer, novamente, sua tradição histórica de luta democrática, prova de que nossos baianos-brasileiros corações não curvam à tirania e trazem consigo a herança daqueles que um dia morreram em defesa da liberdade. Certamente, não foi o primeiro, muito menos será o último passo para a construção de uma composição mais plural, mas seguiremos caminhando, cientes de que o tempo presente nos une – como nos ensinou Maria Stella de Azevedo Santos, Mãe Stella de Oxóssi, “nosso tempo e? hoje, já, agora”.

Fabrício de Castro Oliveira
Presidente OAB-BA

Daniela Portugal
Presidenta da Comissão da Mulher Advogada OAB-BA