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[Entrevista: Presidente do TED faz balanço das ações]

Entrevista: Presidente do TED faz balanço das ações

Simone Neri falou dos trabalhos do Tribunal nesses três anos e atuação na pandemia

A presidente do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB da Bahia, Simone Neri, apresentou as ações do órgão ao longo desses quase três anos de gestão. Em entrevista, Neri falou, dentre outros pontos, a respeito do trabalho de correição, os efeitos da ampliação do número de turmas e da criação do Órgão Consultivo, além da atuação do Tribunal durante a pandemia. Confira.

No início da gestão, o TED passou por algumas mudanças, a exemplo do aumento de turmas julgadoras, de cinco para nove, criação de um Órgão Consultivo, criação da Comissão de Admissibilidade, dentre outras, com o objetivo de trazer mais eficiência ao Tribunal. Hoje, quase três anos depois, qual foi o resultado que isso trouxe em termos de produtividade?

Após a correição realizada no início de 2019, identificamos que existiam 10.244 processos distribuídos nas fases de admissibilidade, instrutória, julgamento e recursal. De lá pra cá recebemos mais 2.232 novos processos. Portanto, a gestão 2019/2021 ficou responsável por conduzir 12.476 processos.

Desse acervo, 3.176 casos foram arquivados. Esse trabalho foi especialmente desenvolvido pela Comissão de Admissibilidade identificando os processos iniciais que não preenchiam os requisitos mínimos necessários, evitando que inúmeros advogados, advogadas e estagiários viessem a responder sobre sua atuação profissional perante a OAB. As turmas e Presidência do TED julgaram 2.353 processos. Hoje nós ainda temos 5.744 processos na fase instrutória.

Nosso Órgão Consultivo respondeu dezenas de consultas, emitiu pareceres orientativos à classe, implementou o projeto “Conversando com o TED”, promovendo a discussão da ética na prática do dia a dia da advocacia.
Conflitos disciplinares em que todas as partes são advogados e/ou sociedade de advogados passaram a ser submetidos à mediação perante a Câmara de Mediação da OAB, contribuindo para que vários casos fossem concluídos sem o avanço do litigio disciplinar.

Considerando que se trata de um trabalho voluntariado, que os membros do TED continuaram desenvolvendo apesar de enfrentarem, em suas casas e escritórios, todos os efeitos da pandemia covid-19 e de nossas estruturas institucionais terem que ser reinventadas em razão disso, considero que tivemos uma produtividade muito positiva.

É uma quantidade grande de casos que não foram adiante, quais as principais causas identificadas pela Comissão de Admissibilidade que levaram ao arquivamento desses processos?

Os pedidos de apuração de conduta de advogados devem conter, dentre outros requisitos, um começo de prova da conduta a ser investigada. Diversas pessoas e/ou autoridades noticiam à OAB condutas profissionais que entendem lesivas, infracionais, mas não encaminham as provas necessárias para tal constatação. Por exemplo, um juiz, quando noticia a OAB que certo advogado não está comparecendo às audiências, apesar de intimado para essa finalidade, deverá anexar a esse encaminhamento as provas de que o advogado está constituído nos autos, as certidões das intimações dando conta de que ele foi cientificado do seu dever de comparecer às audiências e os termos de audiência registrando a ausência do advogado, sem esses elementos não há como instaurar um processo. No caso dos particulares, alegações de que o advogado se apropriou de valores, de que está cobrando honorários acima do contratado, dentre outras alegações, precisam vir acompanhadas da prova de que, pelo menos a relação jurídica entre as partes existiu, sem isso não temos como avançar.

Os anos de 2020 e 2021 estão marcados pela pandemia do novo Corona vírus. Como tem sido a atuação do Tribunal ao longo desse tempo?

Passado o impacto inicial, nós tivemos que reinventar todas as rotinas e procedimentos das Secretarias que dão suporte ao TED, assim como a atuação dos relatores. As audiências e sessões de julgamento passaram a ser realizadas na ambiência virtual, por videoconferência, tivemos também que acelerar ainda mais a digitalização dos autos para implementar o processo digital.

Com essa mudança de atuação para o meio virtual houve um aumento ou diminuição de infrações disciplinares que TED recebido?

O que percebemos é que houve um aumento significativo das denúncia de publicidade indevida, principalmente, nas redes sociais e plataformas digitais, e uma diminuição da quantidade de processos requeridos por particulares. No primeiro caso, atribuo ao fato de que a advocacia já vinha clamando por uma mudança do provimento que regula a publicidade do advogado, com a chegada da pandemia e aceleração do uso das mídias e plataformas digitais, vários advogados, no anseio de não perder o contado com sua clientela, prospectar novos clientes e tornar seu trabalho conhecido, passaram a abusar dos instrumentos que até então lhe eram permitidos.

Quanto ao segundo caso, em razão dos clientes e terceiros ficarem sem acesso direto ao Poder Judiciário que, em sua boa parte, não está ainda com o atendimento presencial regular, fica mais difícil identificarem a má atuação profissional. 

Quais comportamentos relacionados a publicidade do advogado foram mais recorrentes nesse período pandêmico?

O uso de links patrocinados, a divulgação de lista de clientes, o uso de sinais de ostentação, promessas de êxito, uso de captadores de clientela/influenciadores digitais, distribuição de vantagens, divulgação de êxito, dos resultados obtidos, só para exemplificar.

No dia 21 de agosto entra em vigor o novo Provimento de Publicidade da OAB. Quais são as expectativas do TED em relação a isso?

O novo provimento permanece subordinado aos princípios definidos do Código de Ética e Disciplina, então toda a interpretação do que é permitido e do que é proibido terá o Código de Ética e Disciplina como ponto de partida. A publicidade feita pela internet ou qualquer outros meio eletrônico/digital continua tendo o caráter meramente informativo e o dever de agir com discrição e sobriedade: a proibição de: induzir o cliente ao litígio, de divulgar ou deixar que sejam divulgadas lista de clientes e demandas, promoção pessoal ou profissional. 

Há uma percepção equivocada de que o novo provimento liberou a publicidade na advocacia de qualquer restrição, e não é assim, existem limites e proibições bem evidenciados e que precisam ser observados. Por outro lado, o TED tem a expectativa que a Diretoria do Conselho Federal instale, o quanto antes,  o Comitê Regulador do Marketing Jurídico que vai, de certa forma, contribuir para a interpretação dos dispositivos sobre publicidade e informação.

Através do Órgão Consultivo, o Tribunal tem emitido pareceres sobre diferentes temas envolvendo questões éticas. Especificamente sobre a publicidade, o que já foi feito para orientar a classe?

A primeira preocupação do TED foi analisar os efeitos do novo Provimento nos processos em curso e nos pedidos de instauração pendentes de análise de admissibilidade, concluindo, em orientação que: “em relação aos processos éticos-disciplinares em curso, que averiguam condutas que, em tese, continuam a ser consideradas proibidas, aplica-se a regra vigente ao tempo da prática do ato. Em relação aos processos éticos-disciplinares em curso, que averiguam condutas que, em tese, passaram a ser consideradas proibidas, não haverá aplicação da norma posterior mais gravosa. Caso a conduta sob averiguação protraia-se no tempo, a aplicação da norma posterior mais gravosa limitar-se-á exclusivamente às ações praticadas a partir de sua vigência. Em relação aos processos éticos-disciplinares em curso, que averiguam condutas que, em tese, deixaram de ser consideradas proibidas, aplica-se a regra nova mais favorável ao acusado”. Essa orientação já se encontra disponível no site da OAB.

Ainda com um olhar na prevenção e na orientação, o Ciclo de Palestras com o TED do último dia 25, abordou exatamente esse tema, tivemos como convidado Dr. Guilherme Celestino, especialista em direito digital, trazendo as primeiras reflexões sobre o que poderá ser feito a partir do novo provimento e o que continua proibido. Os interessados podem acessar o link.

Quais medidas o Tribunal vem tomando em relação ao uso indevido da publicidade?

Além da instauração de processos disciplinares contra o advogado infrator, quando se verifica que a sociedade de advogados que este integra está se beneficiando da publicidade indevida, o processo é instaurado também contra os sócios que a integram, pois estes deveriam zelar para que a sociedade não fosse envolvida nos desvios de nenhum de seus integrantes. 

O TED também vem proibindo a veiculação de publicidade em jornais, revistas e periódicos de grande circulação que tem o potencial de atingir número indeterminado de pessoal, proferindo decisões liminares proibindo que advogados e advogadas anunciem participação ou patrocínio de eventos sociais que representem mercantilização da profissão e captação de clientela; proibindo de  veicular em redes sociais fotos, vídeos, reels de auto engrandecimento; proibindo de distribuir brindes indiscriminadamente fora de eventos de interesse jurídico; proibindo publicidade que não tenham conteúdo jurídico.

É importante lembrar que, quando um advogado descumpre uma liminar do TED, termina por praticar nova infração disciplinar, ensejando a abertura de novo PAD. Uma primeira condenação por uso de publicidade indevida leva a pena de censura, mas a reincidência leva a suspensão do exercício profissional por um período que pode variar de 30 dias a 12 meses.

Há casos em que o TED/BA também comunica fato à Corregedoria Nacional, principalmente nos casos mais graves, podendo ainda encaminhar à Procuradoria Jurídica para a adoção de medidas judiciais quando isso se fizer necessário.

Foto: Angelino de Jesus/OAB-BA