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Dez anos da Comissão de Ética Pública trazem indagações

Por Roberto Caldas

A Comissão de Ética Pública completa dez anos hoje, dia 26 de maio. Surgem indagações se a Comissão tem cumprido o seu papel e se há o que comemorar. Em vez de apenas respondê-las positivamente, parece-me mais importante lançar uma reflexão à sociedade sobre a relação direta entre o desenvolvimento e a ética.

A Comissão é órgão autônomo vinculado ao presidente da República, que nomeia seus sete membros para mandatos de três anos, renováveis uma vez. Seus integrantes não são remunerados ou vinculados ao serviço público, para que mantenham a necessária autonomia e imparcialidade. Devem ser cidadãos com legitimidade para representar a sociedade e preencher requisitos de “idoneidade moral, reputação ilibada e notória experiência em administração pública”. Afinal, é instância consultiva do presidente da República em matéria de ética e julgadora da chamada alta Administração Federal.

A estruturação da ética pública tem razão de ser muito superior à mera punição aos faltosos:. é o direito ao desenvolvimento social e econômico, classificado universalmente como um direito humano inalienável. Nos termos da Declaração sobre Direito ao Desenvolvimento das Nações Unidas, “toda pessoa e todos os povos estão habilitados a participar de um desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades fundamentais possam ser plenamente realizados” (artigo 1º). Em nossa Constituição, de igual maneira, o direito ao desenvolvimento está presente em seus primeiros artigos.

Onde entra a ética nesse contexto? O desenvolvimento sustentável não floresce sem transparência *e ética, sendo essa conclusão comum de estudos de organismos internacionais como a ONU, Unesco, OEA, Banco Mundial e BID. E para conquistar um ambiente ético em geral, que abarque também o setor privado e o cidadão comum, é preciso incrementar a ética da elite dirigente.

A Comissão, apesar da estrutura enxuta, desenvolveu ao longo deste decênio um silencioso mas notável trabalho no âmbito do Executivo. Armada de um Código de Conduta simples, tem traçado orientações e produzido treinamentos, palestras e prestado consultas às autoridades, bem como aplicado sanções, que vão desde simples orientações até a sugestão de exoneração de servidores públicos.

Tem resolvido conflitos de interesses, inclusive com a determinação de se desfazer de bens particulares, empresas ou aplicações financeiras que possam, ainda que aparentemente, resultar em conflito ético, maculando a confiança e o respeito do público na integridade, moralidade, clareza de posições e decoro das autoridades.

Descompassos entre os três Poderes, com proibições no Executivo que são admitidas no Legislativo e no Judiciário. Por exemplo, viagens, hospedagens, participações em seminários, remuneração de fontes privadas, nepotismo. Acabam temas de páginas dos jornais.

Não seria hora de pensar-se em um código de conduta comum e uma comissão julgadora única para os três Poderes?

Importante também é observar a diferença vantajosa do código de conduta para o código de ética. O de conduta – adotado pelo Executivo – prevê atos proibidos ou permitidos, enquanto o de ética é apenas genérico, não descrevendo condutas. Ao estabelecer normas claras, dilemas que afetam a reputação da autoridade e da organização passam a ser tratados objetivamente, dando segurança à autoridade no agir. A geração de um ambiente transparente e ético evita o conflito de interesses e a perda de credibilidade. Fecha a antessala da corrupção.

Outra vantagem da Comissão do Executivo é que sua composição é de membros externos às carreiras julgadas. Ao contrário, no Legislativo são comissões compostas pelos próprios pares. No Judiciário, cujo Código de Ética ainda completará um ano de existência, também deve ser assim.

A diferença de tratamento entre os agentes públicos pode ser solucionada com um avanço: os três Poderes pactuarem um novo código de conduta e uma nova comissão de ética abrangentes de todas suas maiores autoridades, para gerar jurisprudência única, transparente, socialmente controlada e condizente com o desenvolvimento que bate à porta do País. A chave-mestra é a Ética.

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Roberto Caldas é juiz ad hoc da Corte Interamericana de Direitos Humanos, presidente da Comissão Nacional de Direitos Sociais da OAB e advogado nas áreas constitucional, trabalhista e social.